O fundamento lógico para a privatização total

Tenho três objetivos.  Primeiro, quero esclarecer a natureza e a função da propriedade privada.  Segundo, quero esclarecer a distinção entre “bens comuns” e propriedade e “bens públicos” e propriedade, e explicar o erro estrutural inerente à teoria dos bens públicos e da propriedade.  Terceiro, quero explicar o argumento lógico e os princípios da privatização.

1. Preliminares teóricas

Começarei com algumas considerações teóricas e abstratas, porém fundamentais, sobre as causas dos conflitos e sobre o propósito das normas sociais. 

Caso não houvesse conflitos interpessoais, não haveria a necessidade de normas.  O propósito das normas é ajudar a evitar conflitos que normalmente seriam inevitáveis.  Uma norma que gera conflito — em vez de ajudar a evitá-lo — é por definição contrária ao próprio propósito das normas; ou seja, trata-se de uma norma anômala ou uma deturpação.

Frequentemente se considera que os conflitos resultam do simples fato de diferentes pessoas terem diferentes interesses ou ideias.  Mas isso é falso — ou, no mínimo, extremamente incompleto.  O simples fato de indivíduos terem ideias e interesses diversos não significa que conflitos necessariamente surgirão.  Eu quero que chova e meu vizinho quer que o sol brilhe.  Nossos interesses são contrários.  No entanto, como nem eu nem meu vizinho controla o sol ou as nuvens, nossos interesses divergentes não geram consequências práticas em termos de conflitos.  Não há nada que possamos fazer quanto ao tempo. 

Da mesma forma, eu posso acreditar que A gera B, e você pode acreditar que B é causado por C.  Ou eu creio em Deus e faço orações, e você não.  Se essa for toda a diferença que existe entre nós, nenhum conflito irá ocorrer.  Interesses e crenças divergentes podem levar ao conflito somente quando são colocados em prática; somente quando nossos interesses e ideias são implementados em objetos fisicamente controlados — isto é, em bens econômicos ou em meios de ação.  

Ainda assim, mesmo que nossos interesses e ideias sejam implementados em bens econômicos, nenhum conflito irá surgir enquanto nossos interesses e ideias estiverem relacionados exclusivamente a bens distintos (fisicamente separados).  O conflito surge apenas quando interesses e crenças divergentes são implementados e investidos no mesmo e único bem.  Em Cocanha, onde há uma superabundância de bens, nenhum conflito pode surgir (exceto conflitos relacionados à utilização de nossos corpos físicos que agregam nossos próprios interesses e ideias).  Há uma abundância e um excesso de bens o suficiente para satisfazer os desejos de todos.

Para que interesses e ideias divergentes resultem em conflito, os bens devem ser escassos.  Somente a escassez possibilita que interesses e ideias divergentes sejam aplicados e investidos no mesmo estoque de bens.  Conflitos, portanto, são desavenças físicas relacionadas ao controle de um mesmo estoque de bens.  As pessoas entram em desavenças porque querem utilizar os mesmos bens de maneiras distintas e incompatíveis.

Entretanto, mesmo sob condições de escassez, quando os conflitos são possíveis, eles não são necessariamente inevitáveis.  Todos os conflitos relacionados ao uso de qualquer bem poderão ser evitados somente se cada bem for propriedade privada — isto é, somente quando o bem em questão for controlado exclusivamente por algum indivíduo ou grupo de indivíduos em específico, e sempre for deixado claro qual bem é propriedade de quem, e qual não é.  Nessa situação, os interesses e as ideias de diferentes indivíduos podem ser totalmente divergentes; nenhum conflito surgirá enquanto os interesses e ideias destes indivíduos estiverem relacionados sempre e exclusivamente às suas próprias e distintas propriedades.

Para se evitar todos os tipos de conflitos, portanto, é necessário apenas haver uma norma relacionada à privatização de coisas (bens) escassas.  Mais especificamente, se o intuito é evitar que haja conflitos desde o início da existência da humanidade, a norma necessária deve considerar a privatização original de bens (a primeira transformação original de “coisas” fornecidas pela natureza em “bens econômicos” e propriedade privada).  Além disto, a privatização original de bens não pode ocorrer por meio de mera declaração verbal — isto é, pela simples elocução de palavras —, pois isso funcionaria (não levaria a conflitos permanentes e insolúveis) apenas se já existisse uma harmonia pré-estabelecida de interesses e ideias entre todas as pessoas.  É claro que tal condição é contrária à nossa suposição inicial de que há ideias e interesses divergentes.  Mais ainda: se tal harmonia de fato existisse, absolutamente nenhuma norma seria necessária!

Portanto, para evitar que haja aqueles conflitos que seriam inevitáveis em outros contextos, a privatização original de bens deve ocorrer por meio de ações: por meio de atos de apropriação original daquilo que anteriormente eram “coisas”.  Somente por meio de ações, que ocorrem no tempo e no espaço, pode um elo objetivo ser estabelecido entre um indivíduo e um bem específico.  (Um elo objetivo é um elo averiguável intersubjetivamente).  E apenas o primeiro apropriador de algo até então sem dono pode adquirir esse algo sem haver conflito.  Pois, por definição, sendo o primeiro apropriador, ele não pode entrar em conflito com outros indivíduos ao se apropriar do bem em questão, pois todas as outras pessoas apareceram somente depois de sua apropriação.

Todas as propriedades, portanto, devem ser retornadas, direta ou indiretamente, — ao longo de uma cadeia mutuamente benéfica (portanto, livre de conflitos) de transferências de títulos de propriedade — para seus apropriadores originais.

Com efeito, essa solução é irrefutavelmente — isto é, não hipoteticamente — verdadeira.  Na ausência de uma harmonia pré-estabelecida entre todos os interesses individuais, somente a propriedade privada pode ajudar a evitar conflitos que de outra forma — sob condições de escassez — seriam inevitáveis.  E somente o princípio da aquisição de propriedade por meio da apropriação original, ou por meio de transferências mutuamente benéficas de um proprietário anterior para um posterior, possibilita que os conflitos sejam evitados por completo — desde o início da humanidade até o final.  Nenhuma outra solução existe.  Qualquer outra regra seria contrária à natureza do homem como um agente racional.

Para concluir: mesmo sob condições de escassez geral é possível que pessoas com interesses e ideias divergentes possam coexistir pacificamente (sem conflito): basta que elas reconheçam a instituição da propriedade privada (ou seja, exclusiva) e sua fundamentação suprema, os atos de apropriação original.

2. Propriedade privada, bens comuns e propriedade pública

Avancemos agora da teoria para a prática, com aplicações.  Suponhamos um pequeno vilarejo, com casas, jardins e campos, todos privados. Em princípio, todos os conflitos relacionados ao uso desses bens podem ser evitados, pois está claro nesse arranjo quem é o dono de cada casa, jardim e campo, bem como quem possui controle exclusivo sobre estes bens e quem não possui.

Porém, há uma rua “pública” que passa em frente às casas privadas, e uma trilha “pública” que passa através dos bosques que circundam o vilarejo e levam até um lago.  Qual é a situação dessa rua e dessa trilha?  Elas não são propriedade privada.  Com efeito, assumimos que nenhum indivíduo alega ser o proprietário dessa rua ou dessa trilha.  Sendo assim, a rua e a trilha fazem parte do ambiente natural em que todos agem.  Todos utilizam a rua, mas ninguém é o proprietário dela; ninguém exerce controle exclusivo sobre sua utilização.

É concebível imaginar que essa situação — ruas públicas sem dono — possa continuar eternamente sem levar a qualquer tipo de conflito.  Entretanto, isso não seria muito realista, pois seria necessário supor uma economia estacionária.  Se houver crescimento econômico, e principalmente um crescimento populacional, conflitos relacionados à utilização da rua pública tendem a surgir e se intensificar.  Embora inicialmente os “conflitos de rua” possam ser pouco frequentes e fáceis de serem evitados, de modo a não causar preocupações, com o tempo eles serão onipresentes e intoleráveis. 

A rua agora está constantemente congestionada e em permanente mau estado de conservação.  Uma solução é necessária.  A rua deve deixar de ser considerada como pertencente à esfera do ambiente — “coisas” externas ou propriedade comum — e deve passar a ser considerada como um “bem econômico”.  Isto, a crescente “economização” de coisas até então consideradas e tratadas como “bens gratuitos”, é a maneira como uma civilização progride.

Duas soluções para o problema de como gerenciar conflitos crescentemente relacionados ao uso de uma “propriedade comum” já foram propostas e tentadas.  A primeira — e correta — solução é privatizar a rua.  A segunda — e incorreta — solução é transformar a rua naquilo que hoje é chamado de “propriedade pública” (o que é muito diferente de sua classificação anterior, “bem comum” e sem dono).  Por que a segunda solução é incorreta ou problemática é algo que pode ser melhor entendido se fizermos uma comparação com sua alternativa, a privatização.

Como é possível que ruas até então sem dono sejam privatizadas sem gerar conflitos?  A resposta sucinta é que isso pode ser feito desde que a apropriação da rua não viole os direitos previamente estabelecidos dos outros proprietários de utilizar essa rua “gratuitamente” (em termos jurídicos, mitigação ou servidão).  Todos os indivíduos devem continuar tendo a liberdade de andar pela rua para ir de uma casa à outra, andar pelo bosque e ir até o lago, assim como antes.  Todos devem continuar com seu direito de passagem.  Desta forma, ninguém pode alegar ter ficado em pior situação com a privatização da rua.

Em termos práticos, o apropriador — com o intuito de materializar e validar a sua declaração de que a rua até então de todos agora é privada, e que ele (e ninguém mais) é o proprietário dela —, seja ele quem for, deve realizar algumas manutenções e trabalhos de reparo ao longo de toda a rua.  Ato contínuo, sendo agora o proprietário, ele — e ninguém mais — pode desenvolver e aperfeiçoar a rua da maneira como achar melhor.  Ele determina as regras e regulamentações relacionadas ao uso da sua rua de modo a evitar todos os tipos de conflito.  Ele pode, por exemplo, construir uma barraca de cachorro-quente na rua, e proibir que outros façam o mesmo; ou ele pode cobrar taxas para fazer a coleta do lixo.  Em relação a forasteiros, o proprietário da rua pode determinar regras de entrada para estranhos não convidados.  Último, mas não menos importante, sendo o proprietário da rua, ele pode vendê-la para qualquer outra pessoa (com todos os direitos de passagem previamente estabelecidos permanecendo intactos).

Em tudo isso, haver uma privatização é mais importante do que especular qual forma específica ela irá assumir.  Dentro do espectro das formas possíveis de privatização, em uma extremidade podemos imaginar um proprietário único.  Um rico morador desse vilarejo, por exemplo, tomou para si a responsabilidade de preservar e restaurar a rua, tornando-se assim seu proprietário.  Na outra extremidade do espectro, podemos imaginar que o reparo ou a manutenção original da rua foi o resultado de um genuíno esforço comunitário.  Nesse caso, não há apenas um proprietário da rua; todos os membros da comunidade serão (inicialmente) seus co-proprietários.

Na ausência de uma harmonia pré-estabelecida de todos os interesses e ideias, esse arranjo de co-propriedade requer um mecanismo de tomada de decisão em relação a como será o desenvolvimento futuro da rua.  Suponhamos que, assim como ocorre em uma empresa de capital aberto, a maioria dos proprietários da rua é quem determina o que fazer e o que não fazer com ela.  Aparentemente, esse tipo de arranjo — decisão majoritária — tende a gerar conflito, mas não é o que ocorre nesse caso.  Qualquer proprietário que estiver insatisfeito com as decisões tomadas pela maioria dos proprietários, e que crer que o ônus colocado sobre ele pela maioria supera os benefícios que ele pode extrair de sua propriedade (parcial) da rua, sempre poderá a qualquer momento sair do arranjo.  Ele pode vender sua quota (participação acionária) de propriedade da rua para outra pessoa, abrindo assim a possibilidade para que haja uma concentração de títulos de propriedade em apenas uma mão, porém mantendo seu direito de passagem original.

Contrastando com esse arranjo, um tipo bastante diferente de propriedade de rua é criado quando a opção de saída não existe — ou seja, quando um indivíduo não tem a permissão de vender sua quota de propriedade da rua ou quando ele é destituído de seu antigo direito de passagem.

Tal situação, entretanto, é justamente a que define e caracteriza o segundo tipo de propriedade, a propriedade “pública”.  A rua pública — no moderno sentido da palavra “pública” — não é um bem sem dono, como era antes.  Existe de fato um proprietário da rua — seja ele um indivíduo, um rei ou um governo democraticamente eleito — que possui poder de decisão exclusivo para criar regras de tráfego e para determinar o desenvolvimento futuro da rua.

Mas o governo da rua não permite que seus eleitores — ou seja, os indivíduos —, os quais supostamente são os co-proprietários da rua, com direitos de propriedade iguais, vendam sua quota de propriedade (tornando-os assim proprietários compulsórios de algo do qual eles podem preferir se desfazer).  O governo não permite que os residentes do vilarejo tenham acesso irrestrito à rua que até então era gratuita; ao contrário, ele condiciona o uso dela ao pagamento de alguma taxa ou contribuição (transformando assim os residentes do vilarejo em proprietários compulsórios da rua caso queiram continuar utilizando-a como antes).

Os resultados desse arranjo são previsíveis.  Ao negar a opção de “saída”, o proprietário da rua “pública” adquiriu um domínio, um controle total sobre a população do vilarejo.  Consequentemente, as taxas e outras condições impostas sobre os residentes do vilarejo para que estes possam continuar utilizando a rua outrora “gratuita” tenderão a se tornar cada vez mais opressivas.

Os conflitos não serão evitados; muito pelo contrário, eles serão institucionalizados.  Dado que não existe a opção de sair desse arranjo — isto é, dado que os usuários das ruas públicas devem agora pagar por aquilo que antes utilizavam gratuitamente, e dado que nenhum residente pode vender e se livrar de sua suposta quota de propriedade da rua, tendo de permanecer continuamente vinculado às decisões tomadas pelo governo da rua —, os conflitos relacionados à utilização, manutenção e desenvolvimento da rua tornar-se-ão permanentes e generalizados.

Pior ainda, com o advento das ruas “públicas”, conflitos são introduzidos também em áreas onde até então ele não existia.  Os proprietários das casas, jardins e campos ao longo da rua terão agora de pagar contribuições para o dono da rua para que possam continuar fazendo o que vinham fazendo até então.  Ou seja, se eles agora têm de pagar impostos para o dono da rua, então, por uma questão de lógica, o dono da rua com isso adquiriu o controle de suas propriedades.  Um proprietário agora deixou de ter o controle exclusivo sobre o uso de sua própria casa.

Mais especificamente, o dono da rua pode interferir nas decisões que o proprietário de uma casa toma a respeito de sua própria casa.  Ele pode dizer ao proprietário da casa o que este pode ou não fazer com sua casa caso ele queira sair dela ou entrar nela.  Isto é, o dono da rua pública está em uma posição em que ele pode limitar, e em última instância até mesmo eliminar — isto é, expropriar — toda a propriedade privada e todos os direitos de propriedade, fazendo assim com que os conflitos sejam inevitáveis e generalizados.

3. A lógica da privatização

Já deve estar claro por que a instituição da propriedade pública é anômala e disfuncional.  As instituições e as normas que lhes sustentam devem supostamente ajudar a evitar conflitos.  Porém, a instituição da propriedade “pública” — de ruas “públicas” — cria e intensifica conflitos.  Portanto, com o propósito de evitar conflitos — ou seja, com o propósito de estimular a pacífica cooperação humana —, todas as propriedades públicas devem ser abolidas.  Todas as propriedades públicas devem se tornar propriedade privada.

Mas como privatizar no “mundo real”, o qual se expandiu para muito além do simples modelo de vilarejo considerado até agora?  Nesse “mundo real” temos não apenas ruas públicas, mas também parques, rios, lagos, terras, praias, edifícios, escolas, universidades, hospitais, casernas, aeroportos, portos, livrarias, museus, monumentos e muito mais.

Adicionalmente, acima dos governos municipais, há uma hierarquia de governos centrais — sejam eles províncias “superiores” ou, em última instância, governos nacionais “supremos” — que são os proprietários de tais bens.  Ademais, como esperado, paralelamente à extensão e à expansão do território pertencente ao estado, o qual tornou-se o proprietário dos bens públicos, e dentro do qual os donos de propriedade tornaram-se meros reféns, sem a opção de saída, a variedade de escolhas que sobrou para as pessoas fazerem a respeito de como utilizarem sua propriedade privada tem sido crescentemente limitada e até mesmo reduzida.  Restou um âmbito pequeno e cada vez menor dentro do qual os indivíduos proprietários ainda podem tomar decisões livremente — isto é, livres de uma possível intrusão ou da interferência de alguma autoridade pública.

Nem mesmo dentro das quatro paredes da própria casa o indivíduo pode mais ser livre e exercitar o exclusivo controle sobre sua própria propriedade.  Hoje, em nome do bem público e na autointitulada condição de dono de todos os “bens públicos”, os governos podem invadir sua casa, confiscar parte ou a totalidade de seus pertences, e até mesmo seqüestrar seus filhos.

Obviamente, no “mundo real”, a questão de como privatizar é mais difícil do que no simples modelo do vilarejo.  Porém, o modelo do vilarejo, em conjunto com uma teoria social elementar, pode nos ajudar a reconhecer qual o princípio (se não todos os detalhes complicados) que existe e que deve ser aplicado nessa tarefa.  A privatização de bens “públicos” deve ocorrer de uma maneira que não infrinja os direitos pré-estabelecidos dos donos de propriedade privada (da mesma maneira que o primeiro apropriador de uma rua comum até então sem dono não infringiu os direitos de terceiros caso tenha reconhecido e respeitado o irrestrito direito de passagem de cada residente).

Como as ruas “públicas” foram a base da qual surgiram todos os outros “bens públicos”, o processo de privatização deve começar com as ruas.  Foi com a transformação das até então ruas comuns em ruas “públicas”, que a expansão da esfera dos bens públicos e dos poderes do estado começou; e é nelas, portanto, que deve começar a solução.

A privatização das ruas “públicas” gera um resultado duplo.  De um lado, nenhum residente será, dali em diante, forçado a pagar qualquer imposto para a manutenção ou criação de qualquer outra rua, local, provincial ou federal.  O financiamento futuro de todas as ruas será responsabilidade exclusivamente de seus novos proprietários (quem quer que eles sejam).  Por outro lado, no que diz respeito aos direitos de passagem de um residente, a privatização não deve deixar ninguém em situação pior do que estava originalmente (ao passo em que também não pode deixar ninguém em situação melhor).

Originalmente, todos os residentes do vilarejo podiam andar livremente pela rua local que passava por sua propriedade, e podiam se locomover de maneira igualmente livre desde sua casa, contanto que as coisas ao seu redor fossem sem dono.  Entretanto, se, durante suas excursões, um indivíduo se deparasse com algo que visivelmente fosse propriedade de alguém — seja uma casa, um campo ou uma rua —, sua entrada estaria condicionada à permissão ou ao convite do proprietário.  Da mesma forma, se um estrangeiro não residente chegasse a uma rua local, sua entrada nesta rua estaria sujeita à permissão do seu proprietário (doméstico).  O estrangeiro teria de ser convidado por algum residente para sua propriedade.  Ou seja, as pessoas podiam se deslocar, mas ninguém possuía um totalmente irrestrito direito de passagem.  Ninguém era livre para se deslocar para qualquer lugar sem jamais pedir a permissão de alguém ou sem ser convidado.  A privatização de ruas não pode alterar esse fato e remover tais restrições, naturais e originais, à “liberdade de ir e vir”.

Aplicando-se ao mundo das ruas locais, provinciais e federais, isso significa que, como resultado da privatização de ruas, cada residente deve ter a permissão de se deslocar livremente em cada rua ou estrada local, provincial ou federal, como antes.  Entretanto, a entrada nas ruas de diferentes estados ou províncias, e especialmente de diferentes localidades, não é igualmente livre, mas dependente da permissão ou convite dos proprietários de tais ruas.  As ruas locais sempre — praxeologicamente — precedem quaisquer ruas interlocais (ruas que fazem a ligação de um local a outro), o que significa que a entrada em diferentes localidades nunca foi livre, mas sim, sempre e em qualquer lugar, dependente da permissão ou do convite dos residentes locais.  Esse fato original é restabelecido e reforçado com as ruas privatizadas.

Atualmente, nas ruas “públicas”, onde todo mundo essencialmente tem a permissão de ir para todo e qualquer lugar, sem absolutamente qualquer tipo de restrição “discriminatória” de acesso, o conflito na forma de “integração forçada” — isto é, de ter de aceitar estranhos não convidados em seu meio e em sua propriedade — tornou-se onipresente.

Em distinto contraste, estando cada rua — particularmente cada rua local — privatizada, as vizinhanças e comunidades readquirem seus direitos originais de exclusão, o qual é um elemento definidor da propriedade privada (assim como o é o direito de inclusão, isto é, o direito de convidar alguém para a sua propriedade).  Ao passo que os proprietários das ruas da vizinhança e da comunidade não estão infringindo o direito de passagem ou o direito de convidar de qualquer residente, eles podem estabelecer os requisitos de entrada para estrangeiros não convidados às suas ruas, impedido assim o fenômeno da integração forçada.

Entretanto, quem são os proprietários das ruas?  Quem pode reivindicar e validar sua reivindicação de que ele é o dono das ruas locais, provinciais ou federais?  Afinal, essas ruas não são o resultado de algum tipo de esforço comunitário, tampouco são o resultado do trabalho de alguma pessoa ou de algum grupo de pessoas claramente identificável.

É verdade, em termos literais, que foram operários que construíram as ruas.  Porém, isso não faz deles os donos das ruas porque eles foram pagos para fazer seu trabalho.  E sem financiamento, não haveria rua.  Entretanto, os fundos pagos a esses operários são o resultado do pagamento de impostos feito por vários cidadãos. Consequentemente, as ruas devem ser consideradas como propriedade desses pagadores de impostos.  Os antigos pagadores de impostos, de acordo com a quantidade de impostos local, estadual e federal que pagaram, deverão ser recompensados com títulos de propriedade sobre as ruas locais, estaduais e federais, títulos esses totalmente comercializáveis.  Eles podem manter esses títulos como um investimento, ou podem se desfazer deles, vendendo-os, ao mesmo tempo em que seguem mantendo seu irrestrito direito de passagem.

A mesma lógica deve ser aplicada à privatização de todos os outros bens públicos, como escolas, hospitais etc. Como resultado, todos os impostos que são atualmente pagos para a manutenção e operação de tais bens devem ser abolidos.  O financiamento e o desenvolvimento de escolas, hospitais etc. será, doravante, responsabilidade exclusiva de seus novos proprietários privados.  Da mesma forma, os novos proprietários desses bens outrora “públicos” serão aqueles residentes que realmente os financiaram.  Eles, de acordo com a quantidade de impostos que pagaram, deverão ser recompensados com títulos de propriedade, plenamente comercializáveis, sobre as escolas, hospitais etc.

Diferentemente do que ocorre com as ruas, entretanto, os novos proprietários de escolas e hospitais não terão nenhuma obrigação de fornecer direitos de passagem (ou qualquer tipo de servidão) no uso futuro de sua propriedade.  Escolas e hospitais, diferentemente das ruas, não eram bens comuns antes de se transformarem em bens “públicos”.  Escolas e hospitais simplesmente não existiam anteriormente como bens — isto é, até elas terem sido de fato produzidas; logo, ninguém (exceto os produtores) pode ter adquirido previamente algum direito de passagem relacionado ao seu uso.

Consequentemente, os novos proprietários privados de escolas, hospitais etc. terão plena liberdade para determinar os requisitos de entrada em suas propriedades e determinar se querem que essas propriedades continuem operando como escolas e hospitais ou se preferem utilizá-las para outros propósitos.

Adendo

Privatização: princípio e aplicações

A única solução efetiva para o problema do conflito — isto é, a única regra ou norma que pode assegurar que não haja conflitos desde o início da humanidade em diante, e que produza “paz eterna” — é a instituição da propriedade privada, baseada supremamente em atos de apropriação original de recursos previamente sem donos ou “comuns”.  Em contraste, a instituição da propriedade pública já começa com conflito, isto é, com um ato de expropriação original de alguma propriedade até então privada (ao invés da apropriação de bens previamente sem dono); e a propriedade pública não acaba com conflitos ou expropriações, mas, sim, os institucionaliza e os torna permanentes.

Donde surge o imperativo da privatização — e por conseguinte o princípio da restituição, isto é, a noção de que a propriedade pública seja retornada como propriedade privada para aqueles de quem ela foi forçadamente confiscada.  Ou seja, bens públicos devem se tornar a propriedade privada daquelas que financiaram esses bens e que podem estabelecer uma reivindicação objetiva — averiguável intersubjetivamente — com esse objetivo.

Aplicar esse princípio para o mundo atual é normalmente complicado e requer um considerável esforço jurídico.  Irei aqui apenas considerar três casos realistas de privatização com o intuito de abordar algumas questões e decisões centrais.

O primeiro caso, cujo exemplo prático que mais se aproxima dele é o da antiga União Soviética, é o de uma sociedade em que absolutamente toda propriedade é propriedade pública, administrada pelo estado.  Cada indivíduo é empregado do estado e trabalha em burocracias, empresas, fábricas e lojas estatais; e todas as pessoas se locomovem e moram em terrenos públicos e em imóveis estatais.  Não há propriedade privada, exceto para bens de consumo imediato, e para objetos pessoais como roupas íntimas, escova de dente etc.  Ademais, todos os arquivos com o passado das pessoas sumiram ou foram destruídos, de modo que ninguém, com base nesses arquivos, pode comprovar alguma reivindicação sobre qualquer parte identificável de alguma propriedade pública.

Nesse caso, o princípio de que cada reivindicação sobre propriedade pública deve ser baseada em “dados” objetivos e intersubjetivamente averiguáveis faria com que os títulos de propriedade (comercializáveis) fossem distribuídos de acordo com a ocupação atual ou passada dos indivíduos: os escritórios vão para os burocratas que os ocupam; as fábricas, para os operários; os campos, para os agricultores; e os imóveis, para seus residentes.  Trabalhadores aposentados recebem títulos de propriedade sobre seus antigos locais de trabalho de acordo com a duração de seus empregos.  Como ocupantes presentes ou passados da propriedade em questão, apenas eles possuem um elo objetivo a essa propriedade.  Foram eles que mantiveram a propriedade como ela é, ao passo que os outros estavam trabalhando em outros empregos públicos.

Todo o resto, isto é, toda a propriedade pública que não esteja presentemente ocupada e que não seja mantida por ninguém (por exemplo, qualquer espaço aberto) se torna propriedade “comum” e passa a ficar aberta para todos os membros da sociedade para ser privatizada por meio da apropriação original.

Essa solução, entretanto, ainda deixa de fora uma questão importante.  Todos os documentos legais presumivelmente foram perdidos.  Porém, as pessoas não perderam suas memórias.  Elas ainda se lembram dos crimes passados.  Elas foram vítimas e testemunhas de atos de homicídio, agressão, tortura e aprisionamento.  O que fazer com aqueles que cometeram esses crimes, que os ordenaram ou praticaram, ou que cooperaram com sua execução?

Deveriam os torturadores da polícia secreta e a toda a nomenklatura comunista, por exemplo, ser incluída nesse esquema de privatização e se tornar proprietários privados das delegacias de polícia e dos palácios governamentais onde eles planejaram e ministraram seus crimes?  A justiça requer, ao contrário, que cada delinquente criminal seja levado a julgamento pelas suas supostas vítimas e, caso seja sentenciado e condenado, não apenas seja excluído do processo de obtenção de absolutamente qualquer propriedade pública, mas também sofra a mais dura das punições.

O segundo caso difere desse primeiro apenas em um aspecto: o passado legal não foi apagado.  Documentos e arquivos ainda existem para comprovar as expropriações passadas e, baseando-se em tais documentos, pessoas específicas podem reivindicar objetivamente pedaços específicos de propriedade pública.  Essencialmente, essa foi a situação dos antigos estados vassalos da União Soviética, como Alemanha Oriental, Tchecoslováquia, polônia etc., onde a tomada de poder comunista havia ocorrido somente uns 40 anos antes — ou seja, apenas uma geração antes (a não há mais de 70 anos, como ocorreu na União Soviética).

Nesse caso, os proprietários originais que foram expropriados, ou os seus herdeiros legais, devem ser imediatamente reconhecidos como os genuínos proprietários da propriedade pública em questão.  Porém, o que fazer quanto aos aprimoramentos de capital que ocorreram?  Mais especificamente, o que fazer quanto às novas estruturas (casas e fábricas) — as quais deveriam se tornar, como discutido acima, propriedade de seus ocupantes presentes e passados — que foram construídas em um terreno devolvido ao proprietário original desse terreno?  Quantos títulos de propriedade o dono do terreno deverá receber e quantos títulos deverão receber os donos da estrutura construída?  Estrutura e terreno não podem ser fisicamente separados.  Em termos de teoria econômica, eles são fatores de produção complementares e absolutamente específicos, cuja contribuição relativa ao valor conjunto de toda a área não pode ser separado.  Nesse caso, a única alternativa possível para ambos os lados da contenda é negociar.

O terceiro caso é aquele que ocorre nas atuais economias mistas — isto é, nas sociais-democracias.  Nestas sociedades, um setor público existe lado a lado com um setor nominalmente privado.  Existem bens públicos e funcionários públicos trabalhando junto às propriedades nominalmente privadas e aos proprietários e empregados de empresas privadas.  Tipicamente, os funcionários públicos que administram propriedade pública não produzem bens ou serviços que sejam vendidos no mercado.  (Para o caso atípico de empresas estatais que produzem valor, veja abaixo).

Sua receita de vendas e sua renda de mercado são zero.  Seus salários e todos os outros custos presentes na operação de bens públicos são, na realidade, pagos por terceiros.  Esses terceiros são os proprietários e os empregados das empresas privadas.  Empresas privadas e seus empregados, contrariamente aos seus equivalentes do setor público, produzem bens e serviços que são vendidos no mercado e, com isso, geram renda.  Dessa renda, as empresas privadas não apenas pagam os salários de seus próprios empregados e custeiam a manutenção de sua própria propriedade, como também pagam — por meio de impostos sobre a renda e sobre a propriedade — os salários (líquidos) de todos os funcionários públicos, bem como os custos de operação de todas as propriedades públicas.

Nesse caso, o princípio de que a propriedade pública deve ser devolvida como propriedade privada para aqueles que realmente a financiaram significa que os títulos de propriedade devem ser transferidos exclusivamente para produtores, donos e empregados privados de acordo com o volume de impostos sobre a renda e sobre a propriedade que eles pagaram no passado.  Todos os funcionários públicos devem ser excluídos desse processo.  Todas as instalações, escritórios e palácios governamentais, por exemplo, teriam de ser liberados por seus atuais ocupantes.  Os salários do setor público só podiam ser pagos por meio dos impostos que confiscavam a renda dos proprietários das empresas privadas e de seus empregados.  Mais ainda: o setor público só existe por causa desse confisco.  Logo, ao passo que os funcionários públicos podem manter a propriedade privada que adquiriram, eles não têm direito algum de reivindicar a propriedade pública que utilizaram e administraram.

(Tal arranjo seria diferente apenas para o caso atípico de uma empresa pública, como uma estatal fabricante de carros, que produzisse bens e serviços vendidos no mercado, e que com isso ganhasse uma renda de mercado.  Nesse caso, os funcionários públicos poderiam fazer um reivindicação legítima de propriedade, dependendo das circunstâncias.  Eles poderiam reivindicar a propriedade completa da fábrica somente caso não exista um proprietário anterior do terreno que tenha sido expropriado e também caso a fábrica jamais tenha recebido subsídios oriundos de impostos.  Caso exista um proprietário anterior que tenha sido expropriado, então os empregados dessa fábrica estatal podem no máximo reivindicar propriedade parcial sobre ela, e devem, para isso, barganhar com o proprietário sua fatia relativa nos títulos de propriedade.  Caso a fábrica tenha recebido subsídios oriundos de impostos, os trabalhadores da fábrica terão de dividir adicionalmente sua fatia nos títulos de propriedade — de acordo com a quantidade de subsídios recebidos — com os empregados do setor privado, os quais pagaram os impostos de onde vieram os subsídios.)

Simultaneamente, com a privatização de todas as propriedades públicas, todas as propriedades nominalmente privadas deverão ser tratadas como propriedade privada genuína.  Isto é, todas as propriedades nominalmente privadas deverão ser liberadas de todos os impostos sobre propriedade ou sobre a renda, bem como de todas as legislações que restringem seu uso (ao passo que todos os acordos previamente concluídos acerca do uso de propriedade entre agentes privados permanecem em vigor).  

Sem impostos, portanto, não há gastos governamentais, e sem gastos governamentais todos os funcionários públicos ficarão sem salários e, consequentemente, terão de procurar empregos produtivos com os quais ganhar dinheiro.  Do mesmo modo, todos aqueles que recebem auxílios e subsídios do governo, bem como aqueles empresários que recebem ordens de compra do governo, verão sua renda ser reduzida ou desaparecer por completo, tendo assim de procurar alternativas de vida.

Essa solução ainda não resolve uma questão importante.  Uma vez que todos os pagadores de impostos (em termos líquidos) já receberam seu número apropriado de títulos sobre as propriedades públicas, como eles irão de fato se apossar dessas propriedades e exercer seus direitos como proprietários privados dessas propriedades?  Mesmo que exista um inventário de todas as propriedades públicas, a maioria das pessoas não possui a mínima ideia de tudo aquilo de que elas agora são (parcialmente) donas.  A maioria tem uma ideia razoável das propriedades públicas locais, mas a respeito das propriedades públicas situadas em outros locais distantes elas não sabem praticamente nada, exceto talvez sobre alguns poucos “monumentos nacionais”.

É praticamente impossível fazer uma avaliação realista do preço “correto” de todas as propriedades públicas e, logo, do preço “correto” de uma ação individual dessas propriedades.  Consequentemente, os preços exigidos e pagos por tais ações seriam totalmente indeterminados e amplamente flutuantes e divergentes, ao menos inicialmente.  Avaliá-los seria extremamente difícil e bastante demorado até que algum investidor ou grupo de investidores comprasse a maioria de todas as ações a fim de começar a operar ou a vender partes de sua propriedade para ganhar algum retorno sobre seu investimento.

Essa dificuldade, entretanto, pode ser superada ao invocarmos novamente a ideia da apropriação original.  Os títulos nas mãos nos pagadores líquidos de impostos não são apenas tickets comercializáveis; ainda mais importante, eles autorizam seus proprietários a retomar a posse de propriedades previamente públicas e que agora estão desocupadas.  A propriedade pública está aberta à apropriação original, e os tickets representam títulos sobre propriedades públicas desocupadas e momentaneamente sem dono.  Qualquer pessoa, portanto, pode pegar seus títulos sobre pedaços específicos de propriedade pública e registrar-se como seu proprietário.

Dado que o primeiro indivíduo a se registrar dono de um pedaço específico de propriedade seria seu proprietário original, é certo que todos os pedaços de propriedade pública passariam quase que imediatamente a ter proprietários definidos.  Mais especificamente, a maioria das propriedades públicas tornar-se-ia, ao menos inicialmente, propriedade privada dos residentes locais, isto é, de pessoas que morassem próximas a um dado pedaço de propriedade pública e que estivessem mais bem informadas sobre seu potencial valor de produtividade.

Ademais, dado que o valor da ação de cada propriedade decresce à medida que mais portadores de tickets se registram como donos de uma fatia dessa mesma propriedade pública, qualquer registro em excesso ou em quantidade insuficiente para determinadas propriedades seria evitado ou rapidamente corrigido.  Consequentemente, cada pedaço de propriedade seria rapidamente avaliado realisticamente de acordo com o valor da sua produtividade.

Escritor: Hans-Hermann Hoppe

Fonte: Instituto Mises

Países mais livres têm saúde melhor

Historicamente, o setor de saúde está entre os desafios mais difíceis para os governos.

Os serviços geralmente são caros e distribuídos de maneira desigual. Além disso, às vezes, serviços financeiros como o seguro de saúde privado, são regulados de maneira danosa.

Na Europa pós-guerra, a sociedade moderna foi construída em torno de vastos estados de bem estar social, com generosas redes de segurança estatizada e assistência médica garantida a todos os cidadãos.

Anos atrás, políticos nos Estados Unidos ampliaram o alcance já intrusivo do governo no mercado de assistência médica com a aprovação do Patient Protection and Affordable Care Act.

Essas leis aumentam drasticamente os impostos, expandem o Medicaid e forçam os indivíduos a comprar serviços de saúde por meio de incentivos monetários negativos.

Na melhor das hipóteses, essas políticas invasivas terão resultados questionáveis.

Ao invés de criar burocracias maciças e ineficientes, os políticos devem reconhecer que a adesão aos princípios de liberdade econômica é a maneira mais eficaz de distribuir os serviços de saúde.

Os países livres têm melhores resultados de assistência médica para seus cidadãos. Além disso, a liberdade econômica também incentiva o empreendedorismo e a inovação, que produzem avanços médicos e novos procedimentos que são vitais ao progresso tecnológico sustentado.

Por isso, os formuladores de políticas devem deixar as políticas de liberdade econômica liderarem o caminho para melhores resultados no setor de saúde.

Ao permitir que os indivíduos escolham serviços de seguro e saúde, os políticos devolvem o poder aos consumidores, colocando a manutenção da saúde em suas mãos.

Por meio da adoção desses princípios de liberdade econômica, governos de todo o mundo podem ajudar seus cidadãos a viverem vidas mais longas e saudáveis.

Do nascimento à morte

No nível mais básico, países com economias mais livres são mais propensos a fornecer melhores cuidados de saúde, desde o nascimento até a morte.

A mortalidade infantil e a expectativa de vida são duas medidas amplas dos padrões de saúde de um lugar. Elas dão indicação da capacidade de uma sociedade em fornecer bons cuidados de saúde a seus cidadãos.

As baixas taxas de mortalidade infantil significam que as mulheres podem se dar ao luxo de cuidar de seus filhos durante toda a gravidez.

Afinal, este é um indicador de que existem boas instalações de assistência médica para prestar cuidados durante e após o nascimento.

A expectativa de vida é outra medida ampla e útil, para saber o quão bem o sistema de saúde de um país está se comportando.

Expectativas de vida mais longas indicam que os cidadãos de um país podem prolongar suas vidas por meio do acesso a cuidados de saúde de alta qualidade, da juventude à terceira idade.

Começar uma vida saudável e forte é vital para o desenvolvimento sustentável da infância e do adolescência.

Mortalidade infantil

A mortalidade infantil continua sendo um grande desafio em todo o mundo, principalmente em países que não adotam os princípios de liberdade econômica.

Baixas taxas de mortalidade infantil estão correlacionadas com níveis mais altos de liberdade econômica (r = 0,505).

Tragicamente, mais de 40 bebês por 1.000 nascimentos morrem nos países mais reprimidos economicamente do mundo (4° quartil do Índice) versus os mais livres (1° quartil), como demonstrado no gráfico abaixo.

Expectativa de vida

Em relação à expectativa de vida geral, cidadãos de países que se enquadram no mais alto quartil de liberdade econômica tendem a viver 14 anos a mais do que aqueles que vivem nos países mais reprimidos economicamente.

Além disso, a relação entre liberdade econômica e a expectativa de vida é positiva.

Analisando os dados das Nações Unidas para a expectativa de vida e as pontuações dos países no Índice de Liberdade Econômica de 2012, é evidente que existe uma forte correlação entre liberdade econômica e expectativa de vida (r = 0,56).

Essa constatação sugere que os países que seguem os princípios da liberdade econômica estão melhor equipados com instalações médicas de qualidade.

Além disso, estes países também possibilitam nutrição saudável adequada, assistência médica preventiva, comunidades mais seguras, melhor acesso à água potável e níveis reduzidos de violência aos indivíduos durante suas vidas.

Saneamento básico

Um barômetro para mensurar a qualidade da saúde é o acesso à água potável e a sistemas que removem rápida e eficientemente os resíduos das áreas de estar.

Comparando dados do Banco Mundial com o Índice de Liberdade Econômica de 2010, há uma correlação entre países com taxas mais altas de liberdade econômica e países com alta porcentagem de pessoas com acesso à água mais limpa e saneamento melhorado (ambos em r = 0,52).

Além disso, também há uma clara tendência em direção aos melhores serviços de disposição de águas residuais em países com maior liberdade econômica.

Embora o tamanho da amostra seja menor (51), os dados do Banco Mundial também indicam que países mais livres têm melhor acesso a serviços de saneamento.

Esses indicadores demonstram que os cidadãos de países com altos níveis de liberdade econômica podem pagar por recursos básicos como encanamento interno, água potável e tratamento de águas residuais.

Essa infraestrutura impede a propagação da câmera e de outras doenças, o que garante às pessoas o acesso à água limpa para beber e cozinhar em suas casas.

No geral, essas instalações contribuem para melhores resultados de saúde em uma sociedade.

Ao impedir a propagação de doenças na fonte, os países melhoram a saúde das pessoas. Isso significa evitar situações em que pessoas ficam próximas ao esgoto exposto ou dependem de água de má qualidade.

Em última análise, isso reduz os custos de assistência médica para cada indivíduo, bem como reduz os danos, os custos e o tempo perdidos devido a doenças.

Prevalência da AIDS

Nas últimas 20 anos, o principal objetivo do envio de assistência humanitária a países em desenvolvimento tem sido retardar e reverter a propagação do HIV.

Desde 2003, o governo dos EUA e parceiros privados, como a Fundação Bill e Melinda Gates, gastaram quase US$ 45 bi em alívio à Aids em vários países, por meio do President’s Emergency Plan for AIDS Relief (PEPFAR).

O PEPFAR tem sido um componente importante na redução da prevalência da Aids, particularmente no continente africano.

Isso porque é um programa que começou no setor privado e foi gerenciado por agências do governo dos EUA que estão fora do alcance da burocracia disfuncional da U.S. Agency for International Aid (USAID).

Estratégias para combater a AIDS e outras doenças, como tuberculose e malária, devem se concentrar em políticas mais amplas e abrangentes.

Dessa forma, serão capazes de melhorar os resultados da saúde por meio de resultados econômicos positivos.

Em particular, países que adotam políticas baseadas nos princípios de liberdade econômica tendem a ter melhores resultados para a mortalidade e à incidência da Aids.

A partir de dados da ONU sobre a prevalência da Aids e o Índice da Heritage de 2009, fica claro que países com economias mais livres tendem a ter taxas mais baixas de HIV.

Fora desta amostra, os países classificados no primeiro quartil por liberdade econômica apresentam níveis consideravelmente mais baixos de prevalência de HIV/AIDS.

Cerca de 1,26 cidadãos por 100 nos países do quartil 1 estão vivendo com AIDS. Para efeito de comparação, esse número é de 2,79 indivíduos por 100 nos países do 4° quartil, composto pelos países menos livres do Índice.

O caso do Botsuana

Botsuana é um exemplo do sucesso da liberdade econômica na obtenção de resultados nos cuidados de saúde.

O país ainda é um dos principais beneficiários do PEPFAR e seus líderes permaneceram comprometidos com os princípios da liberdade econômica nas últimas duas décadas.

Isso resultou em pontuações mais altas no Índice de Liberdade Econômica e uma tendência descendente persistente da infecção pelo HIV.

Como resultado, esses níveis de liberdade econômica significam maior crescimento e riqueza aos cidadãos daquele país. Eles permitiram a Botsuana alocar mais dinheiro para o tratamento de um número relativamente menor de pacientes com AIDS.

Em 2002, Botsuana foi elogiada por abordar de forma proativa a crise de Aids no país, implementando programas que distribuem medicamentos anti-retrovirais aos pacientes.

Como resultado, a prevalência do HIV caiu de um pico de 27% em 2001 para 23,7% em 2010. Isso correspondeu a um aumento de 23% na pontuação de liberdade econômica de Botsuana desde 1995, tornando-o o segundo país mais livre da África subsaariana.

Pelo fato de aumentarem as fileiras burocráticas das ações de ajuda externa tanto na ONU quanto em outros lugares, os projetos de HIV/AIDS nessas agências devem ser reconsiderados.

À medida que os países gerenciam suas dívidas, criam instituições imparciais e combatem a corrupção, seus governos podem estimular o crescimento econômico que traz prosperidade e riqueza.

O HIV é “uma causa e um resultado da pobreza“. Mas, com liberdade econômica, os países podem reduzir a prevalência da doença a longo prazo, enquanto programas como o PEPFAR visam crises imediatas.

Políticas de saúde que promovem a liberdade econômica

Ao invés da monopolização coercitiva da saúde por meio de programas caros e ineficientes, com liberdade econômica são alcançados resultados positivos nesse setor.

A intervenção e a coerção governamental nos mercados de assistência médica estão longe de ser a única ou mais eficaz maneira de alcançar sociedades saudáveis. Como alternativa, os formuladores de políticas poderiam:

Eliminar barreiras

Políticos podem aumentar a concorrência e as opções removendo subsídios e revogando leis que impedem os indivíduos de adquirir serviços de saúde de fontes privadas.

Ou seja, indivíduos devem ter o direito de adquirir assistência médica e seguros, sem os limites das fronteiras geográficas ou de seus status de emprego.

Incentivar a concorrência nas licitações do governo

Onde governos continuam desempenhando um papel importante no sistema de saúde, é preferível que haja concorrência no processo de licitação por parte dos prestadores privados.

A concorrência entre os licitantes ajuda a reduzir custos e incentiva a inovação.

Incentivar a regulamentação de seguros nos níveis local e regional

Regulamentações “tamanho único” ignoram diferenças locais nos mercados de assistência médica e de seguros, reduzindo a inovação e minando as opções.

Em outras palavras, os formuladores de políticas devem se concentrar em regulamentações descentralizadas, permitindo que as regras se ajustem aos clientes.

Fonte: Ideias Radicais

Por que há tantas leis idiotas no Brasil?

“Quer que políticos irresponsáveis gastem menos e criem menos leis idiotas? Pare de dar dinheiro a eles”. A frase de Irwin Schiff parece ter sido cunhada após uma longa observação da realidade brasileira. Afinal, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), entre a constituição de 1988 e 2017, houve em média 800 novas normas por dia, isto é, 5,4 milhões de novas regras que entraram em vigor.

É o que a ciência política denomina de inflação legislativa. Entre suas consequências estão a arbitrariedade, a imprevisibilidade e a insegurança jurídica. Além disso, com um número tão grande de leis em vigor, é praticamente impossível que algumas delas não sejam idiotas.

A Lei dos Grandes Números e as leis idiotas no Brasil

Se existe uma lei que funciona bem além da de oferta e demanda, é a Lei dos Grandes Números (LGN). Trata-se de um teorema fundamental da teoria de probabilidade que diz que um experimento tende a se aproximar de seu valor esperado à medida que o número de tentativas aumenta. Em outras palavras, se existe a probabilidade de algo ocorrer, quanto mais tentativas você tiver, maior a chance de aquele evento de fato ocorrer.

E o que isso tem a ver com leis idiotas no Brasil?

Bem, digamos que exista uma pequena chance, de 1%, de um burocrata ter uma ideia idiota, que será levada adiante em forma de projeto de lei e, em seguida, aprovada para que se torna uma lei.

Segundo a LGN, se houvesse apenas uma única lei no Brasil, a chance de ela ser idiota seria de 1 por cento, ou seja, pouco provável. Contudo, com uma amostra de 5,4 milhão de leis, as chances seriam de que 54 mil delas fossem leis fossem idiotas.

A probabilidade de uma lei ser idiota é maior do que ela ser útil

No exemplo anterior, considerei uma pequena porcentagem de chance de alguém criar uma lei absurda. Mas quero mostrar que, na realidade, é mais provável que uma lei seja idiota do que útil. Ou seja, a probabilidade de que uma lei qualquer seja idiota, é maior do que ela seja boa.

Segundo Friedrich A. Hayek, na vida real a informação está dispersa entre as milhões de pessoas que compõem uma economia. É impossível que um político em Brasília saiba qual a realidade do chão de uma fábrica de cadeiras no interior do Mato Grosso.

Além disso, nem mesmo o dono desta fábrica conhece todo o processo produtivo da cadeira. Afinal, ele recebe alguns insumos prontos e provavelmente não tem ideia de como é produzida a madeira que ele recebe como matéria prima, ou de onde é feito o plantio das árvores que são usada na produção dessa madeira. Portanto, um planejamento central e uma lei que abranja todo o país é, consequentemente, desastrosa.

Pois bem, vimos até aqui que existem, então, dois problemas: (1) O problema da quantidade de leis no Brasil; (2) O problema da qualidade dessa leis.

Vamos, então, refletir sobre essas duas questões e entender porque temos tantas leis e porque elas são tão idiotas com ajuda da economia comportamental.

O problema da quantidade de leis no Brasil

Políticos se elegem a cada quatro anos para receber um salário bastante robusto. Com isso, precisam mostrar algum tipo de serviço em retorno. O viés da ação acontece quando alguém tem a necessidade de agir, dado o que a sociedade espera dessa pessoa, ainda que o melhor a se fazer fosse a não-ação.

Por exemplo, algumas pessoas preferem optar por um tratamento médico, ainda que o mais recomendado seja repouso, porque com o tratamento se sentem fazendo algo ativamente para melhorar seu estado. Da mesma forma, goleiros de futebol raramente ficam parados no gol durante uma cobrança de pênalti, ainda que alguns estudos indiquem que essa seria a ação que lhes traria maior chance na jogada.

Em resumo, é esperado dos políticos que eles tenham algum tipo de ação, de modo a justificar seus salários, ainda que essa ação seja prejudicial.

Dessa forma, a maneira mais assertiva de mostrar algum tipo de “ação” é por meio da criação de projetos de leis. Afinal, não é raro ver deputados, vereadores e senadores utilizando o número de projetos criados para argumentar seu valor para a sociedade.

O problema da qualidade dessas leis

Para explicar o problema da falta de qualidade das leis, ou o quão idiotas elas são, trago duas características relevantes dos nossos políticos e da população em si.

De modo geral, as pessoas (incluindo os políticos) são acometidos pelo chamado Excesso de confiança. Quando perguntadas se as pessoas se consideram melhores motoristas do que a maioria, cerca de 90% respondem que sim, o que é estatisticamente incoerente por definição.

Nossos legisladores se consideram mais capazes de resolver um problema do que realmente são, gerando a sensação de que se eles criarem uma lei, podem resolver os problemas brasileiros. Desta forma, acabam por criar leis idiotas pensando que, na realidade, elas são excelentes.

Além disso, o Efeito Desconto Temporal é algo que agrava ainda mais a falta de qualidade do que é proposto. Evidências mostram que os seres humanos valorizam muito mais um ganho no presente do que no futuro. 

Portanto, estão dispostos a, inconscientemente, sacrificar sua qualidade de vida no futuro por uma gratificação no presente. Isso se torna uma excelente premissa para nossos políticos criarem um pouco de satisfação no presente e jogar a conta para governos futuros.

Aliás, outro fator que potencializa esse efeito é a demora em receber o feedback das medidas propostas, como pontuado por Thaler and Sustein em sua obra Nudge. Os efeitos colaterais dessas leis são difusas, invisíveis no curto prazo aparentes apenas em longo prazo. Desta forma, há um incentivo econômico para criação leis que geram algum valor no presente, às custas de uma destruição no futuro, como impressão de moeda, redistribuição de riqueza, protecionismo, dentre outros.

Considerações finais

Em conclusão, temos que a democracia cria incentivos perversos ao estimular políticos a demonstrarem seu trabalho por intermédio do número de leis criadas.

Ao mesmo tempo que suas inabilidades em reconhecer suas limitações e o clamor do público por soluções de curto prazo criam o ambiente perfeito para o surgimento de leis de baixa qualidade e com enormes efeitos colaterais. Essas duas características acabam por proporcionar esse festival de leis idiotas e absurdas que temos no Brasil atualmente.

Como diria Frédéric Bastiat, “O mau economista vê apenas os efeitos imediatos e que dizem respeito apenas a uma parcela da população. Já o bom economista observa os efeitos de longo prazo e como afetará toda a sociedade”.

Portanto, é fundamental pensarmos nas consequências futuras e desdobramentos das leis que são propostas. Entender que os políticos não tem poderes mágicos e não possuem toda a informação que necessitariam para criar leis. Esse pensamento nos permite parar de esperar soluções na política e, com isso, gerar menos incentivos para que tenhamos tantas leis idiotas no Brasil.

Fonte: Ideias Radicais

Terceirização moral: como os brasileiros ficaram vulneráveis em uma crise

A terceirização moral ocorre quando o estado arroga para si responsabilidades que seriam dos indivíduos. E a crise do coronavírus expôs como isso é prejudicial aos brasileiros, já que ter uma reserva financeira é essencial diante de uma crise, mas apenas 28% dos brasileiros declararam ter poupado algum dinheiro nos últimos 12 meses.

Isso não foi coincidência, mas uma consequência da terceirização moral que indivíduos permitiram ao estado. Ao final, eles ficaram mais vulneráveis a uma crise, algo que precisamos mudar com urgência para proteger a nós próprios.

Apesar de uma pandemia ser um evento raro e externo, não é como se um cenário de instabilidade econômica fosse um fenômeno secular no Brasil, e intriga o fato dos brasileiros não terem aprendido a se preparar para isso.

Vejam: na mochila de qualquer universitário em Curitiba, provavelmente haverá sempre dois artefatos inusitados para um dia de sol: um guarda-chuva e uma blusa (talvez duas). Isso porque o clima da cidade é tão volátil quanto do cenário econômico brasileiro.

Assim, uma chuva cair do nada, o frio surgir ao meio dia e a temperatura variar 20 graus em questão de horas não é surpresa. A lição é clara: prepare-se ou fique molhado e com frio. Os moradores sabem disso e os recém chegados aprendem rápido diante dos incentivos.

Ou seja, diante da volatilidade climática, os curitibanos aprenderam a se preparar para a possibilidade de uma chuva repentina, pois é o racional. Mas por que diante da volatilidade econômica histórica os brasileiros não aprenderam a se preparar para a possibilidade de uma crise?

O descuido previsto

Nessa perspectiva, é também estranho que uma crise econômica tenha atingido o Brasil e o cenário apresente pessoas sem poupança e empresas sem caixa suficiente para alguns meses de dificuldade.

Como resultado, governos federal, estadual e municipal precisaram correr para prestar socorro a todos eles, o que fomenta uma série de fracassos diferentes.

Porém, devido ao nosso histórico de intervenção estatal, surpresa seria se as pessoas estivessem preparadas. Afinal, foi ensinado a elas que o resgate do governo sempre chega.

O estado combate a mentalidade de que a liberdade deve sempre vir acompanhada da responsabilidade. Buscar autonomia é fruto da necessidade de se sustentar mesmo em tempos difíceis.

A terceirização moral ao estado brasileiro

Ao criar um programa de aposentadoria estatal, por exemplo, ele ensina:

  • não se dê muito ao trabalho de poupar.
  • não invista, só trabalhe e eu cuido de você depois.

Na ausência desse programa, as pessoas precisariam se preocupar com o futuro, entender sobre a importância de poupar e de não perder dinheiro.

Ou, quando o estado dificulta o acesso da população às diferentes formas de investimento, por meio de regulamentação e taxas, ele transmite a ideia de que:

  • investir é muito burocrático, e não é tão vantajoso;
  • investir é desnecessário: afinal, eu cuidarei de você.

Em países onde é fácil captar investimentos, os empreendedores recebem um pesado incentivo para defender a cultura de poupar e investir.

Dessa forma, campanhas de marketing poderiam ser feitas para atrair dinheiro aos negócios, reduzindo a preferência temporal da população.

Ao controlar a saúde e ainda regular os seguros até que o setor se torne incapaz de oferecer preços baixos e bons produtos, o estado ensina:

  • não se preocupe com despesas médicas;
  • não se preocupe com seguros, pois são muito caros.
  • calma, eu tenho o SUS para cuidar de você!

Na ausência de tantas barreiras custosas, o acesso à saúde seria muito mais barato e amplamente disponível.

Além disso, as pessoas economizariam para imprevistos ou, pelo menos, teriam mais incentivo para comprar seguros.

E, quando o estado controla a educação tanto diretamente via escolas públicas quanto indiretamente via regulações de currículo, o estado ensina:

  • não pense em outras formas de educar, afinal, são proibidas.
  • matricule suas crianças em uma escola, afinal, é obrigatório.

Sem essas barreiras, não haveria tanta dificuldade em lidar com as interrupções de aulas e as famílias poderiam utilizar métodos de educação digital e de homeschooling.

Além disso, no caso do estado brasileiro, há o histórico de inflação e de impressão de moeda descontrolada. Ao destruir o valor do dinheiro e, dessa forma, as poupanças, ele está ensinando:

  • poupança não vale a pena.
  • gaste hoje, viva o agora e depois a gente se vê.

A cultura do estado brasileiro

Esse intervencionismo estatal, nas mais diversas áreas, é o que impede a “cultura da poupança” de prosperar no Brasil.

Assim como essa cultura gera efeitos econômicos positivos, provenientes de uma preferência temporal mais baixa, também influencia as pessoas a fazerem reservas de segurança para crises.

Como toda regra, é claro que existem exceções: aqueles que querem poupar e precisam passar pelo moedor de carne que são os impostos e as barreiras.

Aliás, um agente especial merece atenção: o Banco Central. O esforço dele, nas últimas duas décadas, tem sido lançar os juros às taxas mais baixas imagináveis.

Por motivos óbvios, isso desincentiva pesadamente a poupança, já que os rendimentos serão mais baixos, por cortesia da intervenção estatal.

Outra consequência é o aumento do endividamento da população, uma vez que, os custos tornam-se menores e a mentalidade dos recursos infinitos passa a vigorar.

Por meio desses métodos, dentre tantos outros, o estado brasileiro cria uma cultura de imediatismo e irresponsabilidade, uma terceirização moral.

Isso significa que indivíduos transferem suas próprias responsabilidades ao estado, reservando para si apenas a necessidade de trabalhar com alguma frequência e não ter planos de longo prazo.

A terceirização moral é uma falsa promessa

Contudo, há um problema maior nessa situação: o estado não salvará as pessoas, pois tende a ser composto pelos mais irresponsáveis da sociedade.

Enquanto políticos responsáveis fazem ajustes, cortes e contenções, políticos populistas aumentam gastos, compram votos e jogam a conta para a próxima legislatura. Qual deles tem mais chance de ser eleito?

Enquanto políticos responsáveis defendem a independência dos indivíduos e um estado pouco interventor, políticos populistas fazem promessas e culpam fatores externos quando tudo da errado. Qual deles tem mais chance de ser eleito?

Infelizmente, esse é um sistema que se retroalimenta: quanto mais políticos populistas são eleitos, mais políticas de terceirização moral são aprovadas.

E, quanto maiores essas políticas, mais amplamente aceita é a cultura de terceirização moral na sociedade, o que eleva a demanda por esses políticos irresponsáveis.

Qual o resultado disso? Uma população constantemente à beira da falência, um estado constantemente à beira da falência e, quando uma crise chega, os dois quebram. Moralmente, e fiscalmente. É isso que precisamos mudar.

Fonte: Ideias Radicais

Construindo as Cidades do Futuro

Quando se trata de atualizar a forma como operam, os governos estão atrasados em relação às organizações privadas. Enquanto as empresas estão constantemente inovando em seus modelos organizacionais, a maioria das cidades ainda funciona com estruturas centenárias. Mas, e se pudéssemos administrar as cidades do futuro como empresas?

Por exemplo, redes, iluminação e serviços de transporte inteligentes tornaram-se mais eficientes devido à inovação. Houve muito progresso na infraestrutura das cidades, mas, as formas fundamentais como são governadas e operadas estão paradas no tempo.

Em outras palavras, a lei e a administração são como o software dos municípios, e uma atualização lhes é devida há muito tempo.

O problema é que nossas estruturas jurídicas atuais são muito rígidas para inovar. Nesse sentido, para que o governo seja inovador, é preciso observar como as startups se renovam.

Iniciativas existentes e ZEEs

“Elas são pequenas, experimentais e responsivas”, disse Max Borders, autor de The Social Singularity. “Se falharem, proporcionam experiência; se tiverem sucesso, criam prosperidade”.

Borders é parte do movimento de Sociedades Startup, que clama por mais experimentação na governança. Assim como o pequeno país de Liberland, os conceitos de plataforma flutuante do Seasteading Institute e as cidades charter também pertencem a esse grupo.

Todas essas iniciativas têm uma coisa em comum: elas estão tentando trazer concorrência para a esfera pública, tratando os serviços de governança como um fenômeno de mercado. 

Isso pode parecer um pouco radical para alguns, mas considerem que isso já está acontecendo em certo grau. Afinal, as associações de moradores e os condomínios estão em expansão nos EUA, tanto em número de moradores como no âmbito dos serviços que prestam.

Cidades inovadoras como Sandy Springs, na Georgia, provaram que é possível que o setor privado forneça serviços municipais. Além disso, muitas Zonas Econômicas Especiais já estão contando com empresas privadas para fornecer segurança.

Com o aumento da adoção de Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), o espaço para experiências territorialmente limitadas em governança está ficando maior.

Em todo o mundo, quase 80% de todos os países têm uma ZEE de algum tipo atualmente. Inclusive, alguns têm várias ZEEs competindo entre si. Ou seja, é apenas uma questão de tempo até que uma empresa privada lance sua própria cidade startup.

Pioneiros das cidades privadas

Titus Gebel, CEO da Free Private Cities, está tentando realizar a ideia de cidades gerenciadas como empresas há anos. Para tanto, ele busca estabelecer uma zona especial autônoma administrada por uma empresa operadora. Segundo ele, isso trará o espírito empreendedor ao setor público.

“Este é um modelo completamente novo de convivência”, disse Gebel. “Estas cidades do futuro terão um incentivo econômico para serem inovadoras. Ao invés de serem sufocados por regulamentações desatualizadas, os empreendedores serão atraídos para uma estrutura legal adaptada às suas necessidades. É assim que se cria prosperidade”.

Gebel já teve sua oportunidade de trabalhar com algumas das mais novas tecnologias de e-governança disponíveis, incluindo as que estão sendo desenvolvidas para projetos de zonas autônomas na América Central.

Esses modelos usam a Blockchain como um método de certificação para transações de propriedade, indo muito além da propriedade tradicional. “Os proprietários podem comercializar diretamente direitos de ar, de poluição e de emissão entre si, sem a necessidade de envolver um intermediário governamental”, relata ele.

“Há mudanças estruturais acontecendo na esfera pública”, acrescenta Gebel. “Tecnologias mais disruptivas, como a Blockchain, estão aumentando o escopo da descentralização, transparência e autodeterminação no governo. Isso impacta a maneira de nós pensarmos sobre as cidades”.

Logo, a descentralização certamente parece ser o novo imperativo das cidades do futuro. Por isso, ele e outros já estão seguindo projetos com essa abordagem, como o Ulex Open Source Legal System, que é, essencialmente, Direito Consuetudinário na Nuvem.

Outro exemplo é a Bitnation, que emite passaportes para cidadãos globais e permite jurisdições não-territoriais. Em suma, até mesmo o gerenciamento está sendo impactado por novas formas organizacionais como a Holacracy.

As cidades do futuro trarão o fim da burocracia

Além disso tudo, Gebel também está esperançoso sobre o uso de ledgers distribuídos para uma forma de governança mais participativa. Sobre isso, o empresário explica:

“A possibilidade de estabelecer contratos inteligentes ao lidar com o governo das cidades do futuro torna a vida mais fácil e menos burocrática. A tecnologia de ledgers distribuídos economiza muito tempo, como é no caso nas transações imobiliárias.

E quanto mais você pode decidir por si, menos se precisa órgãos representativos, os quais, como bem sabemos, tendem a desenvolver seus próprios interesses ao longo do tempo.”

Contudo, Gebel é cético em ver esses sistemas como o único fator de desenvolvimento das cidades do futuro. No geral, ele acha que será necessária uma mudança fundamental de paradigma.

Isto é, sair dos sistemas legais impostos pelas estruturas de governo atuais em direção aos audaciosos e adaptativos sistemas de um mercado de governança competitiva.

Se isso vai funcionar? Apenas o tempo poderá dizer. Na prática, o futuro da governança já está mudando diante de nossos olhos e o seu prefeito pode não gostar disso.

Fonte: Ideias Radicais

A classe política irá pagar pelo que fez?

As quarentenas e proibições decretadas politicamente destruíram recentemente dezenas de milhões de empregos no país. Os políticos reivindicaram efetivamente o direito de infligir danos econômicos ilimitados em busca de zero contágio no COVID-19. Os incentivos perversos que regem a política multiplicaram o dano muito além do perigo original.

Quase 40% das famílias que ganham menos de US$ 40.000 por ano têm alguém que perdeu o emprego nos últimos meses, segundo o Federal Reserve. A Linha Direta de Socorro em Desastres, uma linha direta de crise federal, recebeu quase 900% mais ligações em março em comparação com um ano atrás. Uma análise recente da JAMA Psychiatry alertou que as ordens de permanência em casa e o aumento do desemprego são uma “tempestade perfeita” para maiores taxas de suicídio. Uma organização de saúde da Califórnia estimou recentemente que até 75.000 pessoas poderiam morrer de “desespero” como resultado do desemprego pandêmico e das restrições do governo.

Em nome de salvar vidas, os políticos têm o direito de destruir um número ilimitado de meios de subsistência. Políticos em muitos estados responderam ao COVID-19 descartando o equivalente a uma bomba de nêutrons reversa – algo que destrói a economia e supostamente deixa os seres humanos ilesos. Mas a única maneira de supor que as pessoas não foram feridas é acreditar que sua existência é totalmente desapegada de seus empregos, contas bancárias e pagamentos de contas e aluguéis.

Os políticos se vacinaram contra qualquer culpa pela carnificina econômica, divulgando especialistas que disseram que tudo era necessário. Nos últimos 90 dias, os burocratas do governo se tornaram um novo sacerdócio que pode santificar sacrifícios ilimitados em nome da saúde pública.

Os formuladores de políticas públicas da COVID escreveram para si mesmos a mesma carta que o cardeal Richelieu, estadista francês do século XVII, supostamente deu a seus agentes: “O portador desta carta agiu sob minhas ordens e para o bem do Estado”. Essa carte blanche foi suficiente para colocar assassinatos e outros crimes acima da lei e de reprovações na França. Na América contemporânea, a mesma exoneração é alcançada invocando “ciência” e “dados”. A governadora do Oregon, Kate Brown, proibiu os moradores de deixar suas casas, exceto trabalho essencial, compra de alimentos e outras isenções limitadas, e também proibiu todas as viagens de lazer. Seis condados de Oregon têm apenas um caso confirmado de COVID, e a maior parte do estado tem infecções mínimas. Mas escolas, empresas e outras atividades foram fechadas por comando do governo.

A governadora de Michigan, Gretchen Whitmer, impôs algumas das restrições mais severas, proibindo qualquer pessoa de sair de casa para visitar familiares ou amigos. As infecções por COVID estavam concentradas na área metropolitana de Detroit, mas Whitmer fechou todo o estado – incluindo municípios do norte com infecções quase zero e zero mortes, aumentando o desemprego para 24% em todo o estado. Sua repressão provocou protestos ferozes, e Whitmer respondeu afirmando que seus decretos salvaram 3.500 vidas. Whitmer exonerou-se com uma fórmula estatística dolorosamente etérea em comparação com a devastação física estrondosa em Michigan.

A ordem de fechamento do governador de Kentucky, Andy Beshear, resultou na maior taxa de desemprego do país – 33%. Mas, de acordo com o senador Rand Paul, o impacto do COVID no Kentucky “não foi pior que uma temporada média de gripe“. Mas isso não impediu Beshear de proibir as pessoas de comparecerem aos cultos da igreja e de enviar a Polícia Estadual do Kentucky para colocar avisos aos pára-brisas dos carros, ordenando que os participantes se auto-colocassem em quarentena por 14 dias e relatando-os aos departamentos de saúde locais.

Fechar estados inteiros, incluindo vastas áreas rurais não infectadas, é o equivalente econômico de queimar bruxas ou sacrificar virgens para apaziguar deuses virais raivosos. Como os políticos não se responsabilizam pelos danos econômicos que causam, não têm incentivo para minimizar as interrupções que decretam. Trilhões de dólares em novos gastos com déficit vão atormentar os trabalhadores por muitos anos.

O estado do Missouri processou o governo da China, alegando que é responsável pelas perdas infligidas pelo vírus que aparentemente se originou em Wuhan, na China. A maioria dos observadores prevê que o processo não vai dar em nada. Mas, graças à imunidade política, seria ainda mais impossível para os cidadãos processar os políticos pelos danos que suas ordens de paralizações infligiram aos seus negócios, salários e vidas.

A imunidade política cria uma sociedade de dois níveis: aqueles acima da lei e aqueles abaixo dela; aqueles a quem a lei falha em vincular e aqueles a quem a lei falha em proteger. Essa doutrina legal quase garante que nenhum político enfrentará qualquer responsabilidade pessoal por sua quarentena.

Mesmo o governador de Nova York, Andrew Cuomo, que obrigou asilos a aceitar pacientes do COVID, não terá culpa legal por uma política que contribuiu para mais de 5.000 mortes em casas de repouso em seu estado. A czar de saúde da Pensilvânia, Rachel Levine, emitiu uma ordem semelhante, contribuindo para milhares de mortes em casas de repouso e depois removeu sua própria mãe de 95 anos de uma casa de repouso para mantê-la segura.

Os políticos presumem que não têm culpa por destruir empregos, desde que as vítimas recebam um seguro desemprego temporário. Na verdade, é pior do que isso: os políticos reivindicam o direito de apreender uma fatia dos salários das pessoas que ainda trabalham para recompensar as pessoas cujos empregos destruíram. Uma empresa privada seria capaz de escapar do castigo por quebrar as pernas das pessoas, dando muletas gratuitas às vítimas?

“Melhor prevenir do que remediar” é arriscado quando os políticos não se responsabilizam pelo que devastam. Não há como os políticos compensarem os cidadãos por todo o dano que infligiram nessa pandemia. Essa catástrofe de quarentena do COVID deve ser uma marca negra permanente contra a classe política e os especialistas que santificaram todo e qualquer sacrifício.

Fonte Original: AIER

Tradução: Instituto Rothbard

A refutação definitiva do keynesianismo

[Prefácio do livro O fracasso da Economia Moderna, publicado no site do Instituto Rothbard]

Para a maioria das pessoas, a economia foi sempre a “ciência sombria”, a ser ultrapassada rapidamente por um esporte mais divertido. E, no entanto, um olhar sobre o mundo de hoje mostrará que passamos por cima da economia por nossa conta e risco. A influência das ideias econômicas na história humana, especialmente na história política, tem sido importante; quão diferente seria a vida de todos nós se Karl Marx nunca tivesse vivido e feito girar sua visão fatal!

No século XX, o economista mais influente foi John Maynard Keynes, que varreu o mundo da economia como uma avalanche em 1936, com sua Teoria Geral de Emprego, Interesse e Dinheiro, seus ensinamentos rapidamente se tornando uma nova e entrincheirada ortodoxia econômica.

Henry Hazlitt, neste livro de vital importância e desesperadamente necessário, lança o desafio em uma refutação detalhada e completa da Teoria Geral. Qualquer pessoa tentada a zombar deste debate como uma simples tempestade em um bule acadêmico abstrato, sem relação com o mundo prático atual, poderia ponderar tais afirmações, que podem ser encontradas, inquestionáveis e incontestáveis, em quase qualquer revista de notícias ou coluna de jornal:

  • “Não precisamos mais nos preocupar com uma depressão, porque agora o governo sabe como curá-la – com gastos deficitários e estabilizadores internos”.
  • “Os X bilhões de dólares de gastos militares do governo são um suporte útil para a economia”.
  • “As empresas vão melhorar no próximo trimestre porque o governo pretende conceder mais contratos e executar um déficit maior”.
  • “Para verificar a ameaça à inflação, o governo deve impor alta tributação para aumentar o excesso de poder de compra.”
  • “O principal dever econômico do governo é estabilizar a economia e garantir o pleno emprego.”
  • “Em contraste com o capitalismo do século XIX, que enfatizava a economia e a produção, nosso capitalismo moderno depende para sua prosperidade da demanda do consumidor”.

Estas são a moeda comum da terra, a tal ponto que agora são virtualmente “não controversas”, aceitas por ambos os partidos políticos. E, no entanto, não são verdades primordiais, mas falácias maliciosas, todas elas introduzidas no mundo moderno por Lord Keynes e seus discípulos.

Como foi realizada a Revolução Keynesiana? Como foi colocado o ninho desta égua de falácias mercantilistas desacreditadas? Em primeiro lugar, pela intimidação intelectual. As velhas falácias foram vestidas por Keynes num deserto de escrita obscura e jargão pretensioso, num pântano desconcertante de conceitos estranhos, que os discípulos keynesianos afirmavam ser os únicos capazes de compreender o Mestre.

E tropeçara a Juventude do seu lado. Os economistas mais velhos foram acobardados por luzes mais novas que proclamavam arrogantemente que ninguém com mais de trinta e cinco anos era competente para entender a Nova Economia. Paul A. Samuelson escreveu sobre sua alegria de ter menos de trinta e cinco anos quando esta Nova Revelação foi anunciada ao mundo. E como seu Mestre, eles tinham um inglês eminente e aristocrático – inteligente, charmoso e completamente irresponsável.

Na sua conquista, os keynesianos foram ajudados por dois outros fatores. Por um lado, o mundo, inclinado cada vez mais para o estatismo, estava procurando uma teoria econômica que finalmente tornasse os gastos governamentais e a inflação respeitáveis, enquanto tornava a economia privada e o capitalismo laissez faire anátema em sua antiga casa – entre economistas. Em segundo lugar, a teoria econômica “neoclássica” ensinada em Cambridge (a casa de Keynes) e também na América, tinha lacunas importantes: na falha em integrar a teoria monetária e a economia geral, na falta de uma teoria adequada do ciclo de negócios. Por estas razões, a conquista foi absurdamente fácil.

Mas a verdadeira trahison des clercs veio, não tanto de Keynes e dos keynesianos, nem dos antigos economistas neoclássicos, mas dos economistas que sabiam melhor, e que capitularam, por uma razão ou outra, para a nova ortodoxia. Estes eram os economistas formados na “escola austríaca”, chefiada neste século por Ludwig von Mises, que tinha brilhantemente preenchido as lacunas da tradição mais antiga e tinha mostrado que as causas e os remédios do ciclo econômico e desemprego eram quase exatamente o contrário do que Keynes estava a pregar.

Esta teoria Misesiana, que revelou que a depressão era a carga inevitável imposta à economia pelo boom inflacionário anterior e que o desemprego era causado por taxas salariais excessivas impostas pelos sindicatos e pelo governo, estava começando a ser ouvida na Grã-Bretanha e mesmo na América pouco antes da publicação da Teoria Geral. Mas quando ocorreu a varredura keynesiana, o grosso dos economistas na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, que haviam sido treinados na tradição austríaca, se renderam à nova moda reinante sem lutar. Não foi simplesmente o choque da Grande Depressão, a propósito, que afogou a teoria austríaca, pois essa teoria vinha ganhando aceitação precisamente como uma explicação para a Depressão.

Esta foi, então, a traição crítica dos intelectuais: o magnífico O fracasso da “Economia Moderna” de Henry Hazlitt não foi escrito há vinte anos por um desses economistas “austríacos” – por um Lionel Robbins ou um Gottfried von Haberler. Se isto tivesse sido feito, toda a história do nosso tempo teria sido diferente.

Mas não há nenhuma utilidade em chorar sobre o leite derramado. Este é um grande livro, o melhor e mais completo exercício de demolição econômica desde que Böhm-Bawerk (ele próprio um dos fundadores da “Escola Austríaca”) explodiu a teoria do valor do trabalho de Marx.

A Teoria Geral de Keynes é aqui ridicularizada capítulo por capítulo, linha por linha, com a devida consideração dos últimos desenvolvimentos teóricos. A refutação completa de uma vasta rede de falácia só pode ser realizada por alguém completamente fundamentado numa teoria positiva sólida. Henry Hazlitt tem esse trabalho de base. Um seguidor “austríaco” de Ludwig von Mises, ele é excepcionalmente qualificado para esta tarefa, e desempenha-a de forma excelente.

Não é exagero dizer que este é de longe o melhor livro sobre economia publicado desde o grande Ação Humana de Mises em 1949. O trabalho de Mises estabeleceu a estrutura completa da moderna teoria “austríaca”. A fina crítica de Hazlitt a Keynes, baseada nestes princípios, é um complemento digno do Ação Humana.

Henry Hazlitt, um jornalista econômico de renome, é um economista melhor do que toda uma série de acadêmicos estéreis e, ao contrário de muitos deles, ele se distingue pela coragem: a coragem de permanecer um “austríaco” nos dentes do holocausto keynesiano, juntamente com Mises e F. A. Hayek.

Com base nos seus méritos, este livro deveria conquistar a profissão de economista tão rapidamente como Keynes. Mas se os economistas atualmente na moda lerem este livro ou não, a longo prazo, é irrelevante; será lido, e destruirá o sistema keynesiano. No muito menos, há agora uma geração nova sob trinta e cinco, para trazer esta mensagem à fruição.

Fonte: Instituto Rothbard

Como a liberdade econômica pode ajudar o Brasil a sair da crise

Após reformas como a trabalhista, a previdenciária e a desburocratização promovida pela lei de liberdade econômica, o Brasil voltou a registrar melhorias por dois anos seguidos no Índice de Liberdade Econômica, da Heritage Foundation. Há apenas dois anos o Brasil estava próximo dos países reprimidos economicamente, na 153º colocação.

Contudo, o ambiente de negócios brasileiro ainda é uma tragédia. Segundo o levantamento Doing Business, uma empresa no Brasil gasta, em média, 1.501 horas por ano apenas para pagar impostos.

O segundo país com maior complexidade tributária é a Bolívia, em que uma empresa gasta um terço a menos de horas. Ainda no Ranking de Facilidade de se Fazer Negócios do Banco Mundial o Brasil está atualmente apenas no 124ª lugar entre 190 países. Em outras palavras, a falta de liberdade econômica no Brasil atrapalhará, também, a retomada da economia.

Mas por que alguns países conseguiram realizar reformas de controle e redução do estado e promoção da liberdade? Um fator comum a grande maioria dos países que fizeram essas reformas é o fato de que não as fazer significava um custo ainda maior, que não poderia ser ignorado.

O Brasil precisa aprender com os países que deram certo

Maior liberdade econômica está associada a maior desenvolvimento econômico e social. Há correlações positivas, por exemplo, entre liberdade econômica e melhor preservação do meio ambientemais educação e inovação e melhores indicadores de saúde.

Até os anos 1980, a Nova Zelândia era um país muito similar ao Brasil: cheio de subsídios, gasto público elevado e muitas estatais. Não à toa, o país faliu. Porém, o país fez a escolha certa: após a falência começou profundas reformas econômicas. Hoje é o melhor país para se empreender no mundo, segundo o Banco Mundial

A Estônia nos anos 1990 é um caso similar. Até 1991 o país estava sob a ditadura soviética. Bem como a Nova Zelância, a Estônia poderia se abrir para o mundo e melhorar seu ambiente de negócios, ou ser eternamente um satélite irrelevante da Rússia. Em outras palavras: escolheram liberdade.

Digitalizaram todo o governo, facilitaram o investimento internacional, simplificaram o código tributáriosubstituíram o imposto de renda em empresas por um imposto de 20% em dividendos pagos aos acionistas, com o intuito explícito de incentivar o investimento no país. O resultado? Hoje o salário médio de um estoniano é de 1 472 euros por mês. 

A corrupção também é um problema

Em 2002, a Geórgia era um dos mais corruptos do mundo. Em 2003 o país passou por um dos seus principais acontecimentos históricos: a Revolução das Rosas. O objetivo central era justamente o combate a corrupção.

Reduzindo o poder do estado a partir dessa Revolução, a Geórgia passou de um dos piores países no mundo para o oitavo melhor país para se empreender. O fluxo de investimentos internacionais explodiu de 167 milhões de dólares em 2002 para 340 milhões em 2003 e 449 milhões em 2005.  Em 2016 foram 1,6 bilhões em investimento internacional no país.

Um exemplo muito citado de como o programa de combate a corrupção foi profundo e drástico é que em 2005 o presidente Mikhail Saakashvili demitiu todos os policiais de trânsito do país e contratou novos, sem experiência na profissão e portanto sem histórico ou costume de serem corruptos.

No Brasil, mesmo com o avanço da pandemia do coronavírus, devido a flexibilizações de regras para licitações e compras por parte de estados, inúmeros casos de corrupção explodiram nos últimos meses.

A falta de liberdade econômica deixou outros países estagnados

Praticamente todos os países europeus aumentaram seus gastos, déficits e dívida pública na última década. Não à toa, a estagnação chegou no velho continente. Espanha, França, Bélgica, Itália e Portugal possuem um nível de dívidas acima de 90% dos seus PIBs. A Alemanha, considerada a mais prudente, está em 60%.

Não à toa, o desemprego na França ao longo da última década não se recuperou da crise em 2008, e nunca ficou abaixo de 7%. Salvo o período de 2005 a 2010, o desemprego na Itália desde os anos 90 oscila entre 8 e 12% Além disso, o salário médio na Espanha Portugal hoje é praticamente o mesmo do que dez anos atrás.

Na América, os Estados Unidos chegou a 25 trilhões de dólares em dívidas federais em maio de 2020. É difícil imaginar um ano no futuro onde o déficit do país será menos que um trilhão de dólares. 

Vale ressaltar, também, que esses países também ampliaram enormemente a invasão dos direitos dos indivíduos. Maior monitoramento e controle da internet, mais regulações em cada pequeno pedaço da vida das pessoas são exemplos claros.

Em outras palavras, a crise sanitária está agravando uma crise econômica que vem se formando há décadas. Grécia, Irlanda e Portugal não resistiram a última crise, por exemplo. Hoje, Espanha, França e Itália precisaram se conter muito para evitar o colapso. Na prática, a questão para esses países não é se irão quebrar, mas quando isso acontecerá.

O Brasil precisa de mais liberdade econômica

Atualmente, a dívida pública da Estônia é 8% de seu PIB. Além disso, o país tem um orçamento muito mais equilibrado e um bom ambiente de negócios. Dessa forma, é bastante provavél que a Estônia se recupere mais rapidamente do que a Espanha ou Itália, por exemplo.

Assim, mesmo os países europeus não conseguem mais conter seus gastos e terão níveis de dívida cada vez mais elevados, devido a pandemia do coronavírus. No entanto, como o Euro e o Dólar são moedas fortes, seus bancos centrais podem imprimir moeda para financiar déficits sem que o mundo resolva usar outro ativo.

Ou seja: eventualmente os países que têm escolha perceberão que se legislaram para dentro de um beco e, na verdade, não possuem saída. Por outro lado, os países que não tiveram escolha e já se reformaram estarão em posições confortáveis. É o caso da Estônia.

No Brasil, desde 2014, o país gasta mais do que arrecada. Apenas no ano passado, o rombo fiscal ficou em R$ 95,1 bilhões. A chamada Dívida Bruta do Governo Geral, que abrange o governo federal, os governos estaduais e municipais (excluindo o Banco Central e as estatais), pode chegar a 100% do PIB em dez anos. É o que aponta a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão consultivo do Senado.

O resultado: dezenas de unidades federativas assoladas por caos fiscal, má-infraestrutura e demais fatores que dificultam oportunidades de negócios. Com a crise do coronavírus, a situação tende apenas a se agravar.

Uma eventual melhora na dívida pública nos próximos anos, então, dependerá de maior liberdade econômica no Brasil e da aprovação, depois do fim da pandemia, de uma agenda de reformas que segure os gastos públicos e reduza os rombos fiscais, permitindo a retomada mais rápida do crescimento econômico. O Brasil não tem outro caminho.

Fonte: Ideias Radicais

Impressão de moeda não é a solução para a crise

Em resposta ao coronavírus, os bancos centrais de todo o mundo estão propondo a impressão de moeda.

A justificativa é de que isso vai impedir os efeitos colaterais econômicos negativos que o pânico relacionado à pandemia tem causado nas economias. 

Por mais atraente que pareça, essa visão é incorreta.

A ideia de que mais dinheiro pode reviver uma economia se baseia na crença de que o dinheiro transmite seu efeito por meio de gastos agregados.

Dessa forma, com mais dinheiro no bolso, as pessoas poderão gastar mais e o resto seguirá o exemplo. 

A partir dessa perspectiva, dinheiro é uma forma de pagamento, assim como um meio de financiamento.

Porém, na verdade, dinheiro é um meio de troca e não um meio de pagamento. Isto é, ele não tem vida própria; só possibilita que um produtor troque sua produção pela de outro.

Os meios de pagamento são sempre bens e serviços reais, que pagam por outros bens e serviços. Tudo o que o dinheiro faz é facilitar esses pagamento.

Assim, quando um padeiro troca seu pão por dinheiro e depois usa dinheiro para comprar sapatos, ele paga sapatos não com dinheiro, mas com o pão que ele produziu. O dinheiro apenas permitiu que ele fizesse esse pagamento.

Quando falamos em demanda por dinheiro, o que realmente queremos dizer é a demanda pelo poder de compra do dinheiro.

Afinal, as pessoas não querem uma quantia maior de dinheiro nos bolsos, mas um poder de compra maior.

Sobre isso, Mises escreveu:

Os serviços prestados são condicionados pela altura de seu poder de compra. Ninguém quer ter um número definido de moedas ou um peso definido para o seu dinheiro; ele quer manter uma quantia definida de poder de compra em dinheiro.

Ação Humana, Ludwig won Mises

A moeda é sujeita à oferta e demanda

Em um mercado livre, à semelhança com outros bens, o preço do dinheiro é determinado pela lei de oferta e demanda.

Consequentemente, se houver menos dinheiro, seu valor de troca aumentará. Por outro lado, o valor da troca cairá quando houver mais dinheiro.

No âmbito de um mercado livre, não pode haver dinheiro “pouco” ou “muito”. Enquanto o mercado estiver liberado, não haverá escassez ou excesso de dinheiro.

Dessa forma, uma vez que o mercado tenha escolhido uma mercadoria em particular como moeda, o estoque fornecido dessa mercadoria sempre será suficiente para garantir os serviços que a moeda fornece.

Portanto, em um mercado livre, toda a ideia da taxa ótima de crescimento da base monetária é absurda.

De acordo com Mises:

Como a operação do mercado tende a determinar o estado final do poder de compra da moeda a uma altura em que a oferta e a demanda por moeda coincidem, nunca pode haver excesso ou deficiência de moeda.

Cada indivíduo e todos os indivíduos juntos sempre desfrutam plenamente das vantagens que podem derivar da troca indireta e do uso do dinheiro, independentemente de a quantidade total de dinheiro ser grande ou pequena. […] os serviços prestados pelo dinheiro não podem ser aprimorados nem reparados, alterando a oferta de dinheiro.

A quantidade de dinheiro disponível em toda a economia é sempre suficiente para garantir a todos aquilo que todo o dinheiro faz e pode fazer.

Ação Humana, Ludwig won Mises

Produção e consumo se retroalimentam

Em uma economia de mercado, o objetivo da produção é o consumo. As pessoas produzem e trocam bens e serviços entre si, para melhorar sua vida e bem-estar.

Por sua vez, isso significa que o consumo não pode surgir sem produção, enquanto a produção sem consumo estimado não faz sentido.

Portanto, em uma economia de livre mercado, tanto o consumo quanto a produção estão em harmonia. Nesse cenário, o consumo é totalmente respaldado pela produção.

Logo, o que permite ao padeiro consumir pão e sapatos é a sua produção de pão. Assim, uma parte dos pães é consumida diretamente, enquanto a outra é usada para pagar pelos sapatos.

Observe que seu consumo é totalmente respaldado, ou seja, pago por sua produção.

Qualquer tentativa de aumentar o consumo na ausência de uma produção correspondente leva a um consumo não financiado, que deverá ser custeado por outra pessoa.

É exatamente isso que a injeção de moeda faz. Ele gera uma demanda que não é suportada por nenhuma produção.

A impressão de moeda distorce a poupança

Uma vez gerada, essa demanda prejudica o fluxo de poupança real e, por seu turno, enfraquece a formação de capital real, sufocando ao invés de impulsionar o crescimento econômico.

São economias reais e não dinheiro que financiam e possibilitam a produção de melhores ferramentas e máquinas.

E, com esses insumos, é possível elevar a produção de bens e serviços finais — é disso que se trata o crescimento econômico.

Portanto, contrariamente à maneira popular de pensar, que põe em movimento um consumo artificial pela produção por meio da impressão de moeda, não será promovido crescimento econômico.

Afinal, o consumo não financiado enfraquece o fluxo de poupança real e, consequentemente, enfraquece também a fonte que financia o crescimento econômico real.

Caso contrário, a pobreza no mundo já teria sido eliminada há muito tempo. Afinal, todo mundo sabe como exigir e consumir.

A única razão pela qual no passado as políticas monetárias frouxas pareciam crescer a economia é por que o ritmo da geração real de poupança era forte o suficiente para absorver aumentos no consumo não financiado.

No entanto, uma vez que o ritmo do consumo não financiado chega a um estágio em que o fluxo de poupança real enfraquece a economia, acontecem recessões graves.

Por esse motivo, qualquer tentativa de o banco central retirar a economia da crise, por meio de mais impressão de moeda, torna as coisas muito piores.

A economia real

Certamente, os governos e os bancos centrais tentarão impedir a deterioração econômica causada pelo coronavírus.

Mas, nem esses bancos centrais ou qualquer governo têm os recursos reais para fazer uma economia crescer, pois nenhum dos dois é gerador de riqueza. Ambos se sustentam do desvio de recursos do setor privado.

Isso significa que todas as medidas que o governo tomará devem ser às custas das atividades que estão gerando riqueza. Obviamente, esse processo enfraquecerá a capacidade da economia de gerar bens e serviços.

Portanto, independente das boas intenções, nem o banco central nem o governo são capazes de ajudar a economia a combater os danos infligidos pelo coronavírus.

Somente o setor privado gerador de riqueza é capaz de fazê-lo.

Os que criticam a nossa visão argumentam que a impressão de moeda cria uma ilusão temporária de riqueza, cujo efeito é aumentar a demanda por bens e serviços.

Dessa maneira, um aumento da demanda provocaria um aumento da oferta, isto é, da produção de bens e serviços.

No entanto, vimos que, sem o aumento da economia real, não é possível aumentar a produção de bens e serviços.

Portanto, se a capacidade da economia foi danificada, o aumento da demanda não vai reparar o problema enquanto o fluxo de poupança real estiver enfraquecido.

Frank Shostak é economista austríaco e pesquisador do Mises Institute.

Fonte: Ideias Radicais